Novos números da ONU mostram que o Covid-19 está levando milhões de pessoas à insegurança alimentar. Enquanto isso, a ActionAid alerta que agricultoras e agricultores familiares precisam urgentemente de sementes, crédito e apoio à renda para evitar que a pandemia se transforme numa crise global de fome.
Helena Lopes, assessora de Agroecologia e Justiça Climática da ActionAid, diz:
“O governo deve reconhecer o trabalho de agricultoras e agricultores na linha de frente contra a crise, e deve assegurar que obtenham apoio adequado para que possam continuar cultivando alimentos acessíveis e saudáveis para suas comunidades e para as famílias brasileiras.”
“A agricultura familiar fornece cerca de 70% da produção alimentar no Brasil. Na África e na Ásia, esse recorte chega a 80%. Até o momento, no entanto, agricultores/as estão sem resposta dos governos para solucionar a crise da Covid-19. As mulheres agricultoras, em particular, enfrentam três problemas: a renda perdida, o aumento do trabalho doméstico não-remunerado e a crescente violência de gênero.”
Alimentos da agricultura familiar que compuseram cestas entregues pelo CTA-ZM, parceiro da ActionAid em Minas Gerais
A ActionAid pede que os governos encontrem formas de garantir renda aos agricultores e agricultoras familiares. O poder público pode, por exemplo, comprar desses produtores locais para providenciar as cestas básicas que serão distribuídas para famílias em situação de vulnerabilidade.
A organização de justiça social alerta que essas pessoas podem se ver forçadas a vender suas ferramentas de trabalho (terras e ativos). Para evitar isso, governos precisam expandir programas de proteção social, assistência médica rural e outras formas de apoio, como acesso facilitado a créditos e fomentos.
O relatório da ONU sobre Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo, publicado nesta segunda-feira (13.07), mostra que mais de 690 milhões de pessoas passam fome. É possível que a crise do coronavírus ainda agrave a insegurança alimentar de 132 milhões de pessoas.
“A fome vem em ascensão ao longo dos últimos cinco anos e as mudanças climáticas colaboram diretamente para esse cenário. A meta global de acabar com a fome até 2030 está vergonhosamente fora dos trilhos”, diz Helena Lopes.
Ainda segundo o relatório, 2 bilhões de pessoas não têm acesso a comida segura e de qualidade.
“É urgente que os planos de recuperação da Covid-19 priorizem o investimento em sistemas alimentares locais sustentáveis e resilientes às mudanças climáticas para garantir que nossa população possa viver, produzir e se alimentar com dignidade e enfrentar outros desafios que virão. “
A crise da Covid-19 está levando milhões de pessoas à insegurança alimentar no Sul e no Norte globais.
No Brasil, somente na região do Semiárido os parceiros da ActionAid já entregaram cestas de alimentos produzidas por agricultores e agricultoras familiares a mais de 8.000 famílias. Essas ações, que acontecem também em outras regiões do país, vêm levando segurança alimentar para famílias que perderam seus meios de subsistência durante a pandemia e gerando, no campo, renda para os/as agricultores. As medidas beneficiam especialmente as mulheres, as mais atingidas pelos impactos sanitários, econômicos e sociais do novo coronavírus.
A ActionAid no Brasil, junto com mais de 800 organizações, redes e movimentos, assinou a proposta mobilizada pela Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e enviada ao Governo Federal que prevê investimentos no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que desde 2003 apoia agricultores e agricultoras familiares e possibilita a entrega de alimentos saudáveis em hospitais, escolas e restaurantes populares. Nos últimos anos, o financiamento a esse Programa, central na garantia da segurança alimentar e nutricional das famílias brasileiras e na geração de renda no campo, foi reduzido drasticamente. A proposta enviada previa apoio de R$ 1 bilhão de reais à agricultura familiar, que tem sido duramente afetada pelo fechamento de mercados, como feiras e quitandas, e das escolas, devido à pandemia. Até o momento, R$ 500 milhões foram concedidos.
Na Índia, entre março e junho, a ActionAid entregou cestas de alimentos a 3,9 milhões de pessoas. A ação fez parte da resposta à crise da Covid-19, e priorizou famílias nas comunidades mais pobres e marginalizadas, incluindo sobreviventes de violência de gênero, profissionais do sexo, minorias étnicas, pessoas com deficiência, migrantes e trabalhadores informais.
Na Itália, o programa voltado à insegurança alimentar da ActionAid foi criado há três anos, com o objetivo de apoiar os bancos de alimentos locais. É uma resposta à crescente necessidade de assistência alimentar, particularmente de migrantes recém-chegados, fugidos de conflitos, da fome e das mudanças climáticas do Sul Global. Porém, com a crise do coronavírus, é crescente o número de cidadãos locais empurrados para a insegurança alimentar, que agora contam com o projeto para alimentar suas famílias.
A demanda por assistência alimentar aumentou 20% desde o início da pandemia – o banco de alimentos agora atende cerca de 1.000 pessoas com alimentos e outros itens essenciais, incluindo fraldas e equipamentos de proteção individual.
Antes da pandemia, a ActionAid já vinha dando respostas a uma crise climática e alimentar na África Austral, causada pela pior seca na região em 35 anos, dois ciclones e inundações. Esse cenário deixou 45 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar.
No Zimbábue, antes da chegada da Covid-19, 7,7 milhões de pessoas passavam por insegurança alimentar e a taxa de emprego estava em 80%. A crise climática encurtou a estação agrícola, deixando os pequenos agricultores pobres. Eram em sua maioria mulheres residentes em áreas rurais, com rendimentos dramaticamente reduzidos.
Espera-se que quase 9 milhões de pessoas passem fome até outubro. O preço do milho subiu 66%: são 5 dólares para 20 kg do alimento.