Idosos unem-se a seus amigos em condomínios e vilas ao redor do mundo para formar pequenas comunidades e envelhecer em boa companhia
Esqueça a imagem de comunidades hippies e repúblicas de estudantes – os adultos que se acercam da terceira idade (ou já estão nela) fazem questão de individualidade e conforto. Mas querem os amigos por perto, recusando-se à solidão. Esse mal, que atinge uma em cada três ou quatro pessoas nos países ocidentais, pode elevar em 14% o risco de morte dos mais maduros, segundo estudo da Universidade de Chicago. Em reportagem especial, Casa Vogue de outubro fala sobre envelhecer juntos, e mostra que o tema está mais em voga do que se possa imaginar.
O desejo de viver em proximidade com outros originou o cohousing, modalidade de habitação que reúne um pequeno grupo em um mesmo terreno. Nela, diferentemente do coliving (no qual todo mundo se junta sob um único teto), cada integrante ou núcleo familiar possui sua casa. No entanto, todos cultivam a interação, dividindo tarefas e momentos de lazer em um espaço comum, muitas vezes equipado com cozinha, e em áreas como horta, academia, piscina e tudo o mais que os membros decidirem ter. Ajudar os demais é premissa.
Este modo de vida, desenhado na Dinamarca dos anos 1970, alcançou outros países europeus, além dos Estados Unidos, em especial a Califórnia, e do Canadá. Na costa oeste canadense, na ilha de Vancouver, encontra-se a Harbourside House, fundada em 2013. Um de seus atuais residentes é o assistente social aposentado David Hannis, divorciado e pai de duas filhas. Quando chegou à comunidade sênior, quatro anos atrás, ele voltava de uma feliz experiência de trabalho na Nigéria e sentiu-se solitário no lar anterior. “Harbourside fica em um lugar lindo. O que me atraiu, porém, foi a chance de me conectar emocionalmente com os vizinhos. Tomamos as decisões por consenso e nos disponibilizamos sempre que há necessidade, como levar alguém a uma consulta ou ao aeroporto”, conta o inglês de 74 anos. Ele não deixa de alertar para as dificuldades: “Indivíduos muito egoístas ou intolerantes podem achar bastante desafiador, particularmente quando se trata de pedir socorro ou de priorizar demandas alheias.”
Lilian Lubochinski, 72, concorda com Hannis, mas isso não a impediu de se tornar a principal impulsionadora da tendência no Brasil. “Ela alia privacidade e convivência, e recupera vínculos perdidos com o rompimento do tecido comunitário”, afirma a arquiteta, atuante como mentora de grupos motivados a construir suas vilas. Há dois tipos delas: as intergeracionais, que estimulam o contato entre gente de diferentes faixas etárias, ou as sêniores, voltadas a quem tem mais de 50 anos.
Atualmente, embora existam muitas iniciativas semelhantes por aqui, nenhuma já se viabilizou. A falta de exemplos nacionais impõe obstáculos. “Quando sair a primeira cohousing, várias virão. Na Dinamarca foi assim”, lembra o ex-professor de engenharia de alimentos Bento da Costa Carvalho, 74, que acabou se aprofundando no tema desde que um núcleo de colegas da Unicamp idealizou a Vila ConViver, em 2013. De lá para cá, pessoas entraram na agremiação ou saíram dela, houve muitas discussões sobre o tamanho da vila e das residências, seu modelo jurídico, as funcionalidades principais. No ano passado, por meio da associação dos docentes da universidade, os participantes finalmente adquiriram o terreno e agora se preparam para aprovar o projeto com 34 unidades para 50 moradores.