Você sabia que muitas crianças e adolescentes autistas podem fugir repentinamente, mesmo em ambientes considerados seguros? O comportamento, conhecido como elopement, representa um dos maiores riscos à segurança de pessoas no espectro autista e, infelizmente, voltou ao centro das atenções após uma tragédia recente que comoveu a todos.
O elopement pode ocorrer em questão de segundos. Sem qualquer sinal evidente, a criança se afasta, motivada por fatores como curiosidade, ansiedade, sobrecarga sensorial ou a simples busca por regulação emocional. Essas fugas silenciosas e repentinas podem levar a situações graves — de desaparecimentos a acidentes fatais.
“A fuga não é um capricho ou um ‘comportamento-problema’. Muitas vezes, é a forma como a criança tenta lidar com um ambiente que está sendo insuportável para ela”, explica a Dra. Patrícia Binhardi, psicóloga e especialista em ABA. “É preciso entender o que está por trás dessa ação, para então planejar estratégias reais de prevenção.”
Estudos apontam que cerca de 50% das crianças autistas entre 4 e 10 anos já se envolveram em episódios de elopement. Dentre elas, quase metade ficou em risco de afogamento ou atropelamento. Segundo a Dra. Patrícia, o número pode ser ainda maior, já que muitos casos não são notificados.
Apesar da gravidade, o elopement ainda é pouco discutido fora do contexto clínico e familiar. A falta de compreensão da sociedade em geral pode dificultar a busca por ajuda e a implementação de medidas protetivas.
“Famílias precisam de suporte, não de julgamento. E o primeiro passo é a conscientização pública. Precisamos educar vizinhos, escolas, profissionais da saúde, seguranças, e qualquer pessoa que possa estar ao redor da criança autista”, afirma a especialista.
Prevenção começa com empatia e planejamento
O enfrentamento do elopement envolve uma rede de apoio estruturada, medidas de segurança física e estratégias comportamentais baseadas em evidências. Dentre elas:
Avaliação funcional do comportamento de fuga;
Treinamento de habilidades de comunicação e autorregulação;
Adaptação do ambiente com sensores, travas e cercas;
Uso de tecnologias como GPS e pulseiras de identificação;
Treinamento de cuidadores e familiares.
A recente tragédia que envolveu o desaparecimento de uma criança autista nos lembra, com dor, que o silêncio é um inimigo da prevenção. Precisamos transformar o medo em mobilização.
Falar sobre elopement é também um ato de cuidado coletivo. Juntos, podemos transformar dor em prevenção e construir um mundo mais seguro, empático e preparado para acolher todas as infâncias — inclusive as atípicas.
“Elopement” (fuga ou desaparecimento) em crianças com autismo, um estudo publicado no National Institutes of Health (NIH) indicou que 49% dos pais relataram que seus filhos com TEA tentaram fugir pelo menos uma vez após os 4 anos de idade. Desses, 26% ficaram desaparecidos por tempo suficiente para gerar preocupação. Entre os que desapareceram, 24% corriam risco de afogamento e 65% de acidentes de trânsito. O risco de fuga também foi associado à gravidade do autismo, com um aumento de 9% para cada 10 pontos na pontuação T da Escala de Responsividade Social.