Alimentação: o que estará na mesa do brasileiro em 2020?

Finalistas e vencedores do Prêmio Péter Murányi indicam suas apostas para o próximo ano

O que estará na mesa do brasileiro em 2020? Será que continuaremos tentando seguir uma alimentação saudável, com mais frutas e verduras no cardápio, ou nos renderemos de vez às promoções, levando para casa apenas aquilo que couber no orçamento?

Para especialistas da área, estilos alimentares como o veganismo e o vegetarianismo, que incentivam o consumo de itens mais saudáveis, deverão ganhar ainda mais força.

Pesquisador da Embrapa Soja e um dos vencedores do Prêmio Péter Murányi 2008, o professor José Marcos Gontijo destaca como indicador desse fenômeno a crescente busca dos brasileiros por alimentos livres de lactose, como a soja, seja por terem alguma intolerância ou adesão a um estilo de vida.

“A soja apresenta um excelente valor nutricional, principalmente quanto ao seu elevado valor proteico. É uma ótima fonte de minerais como ferro, cálcio, magnésio e potássio e de diversas vitaminas. É uma boa opção para veganos e vegetarianos”, explica.

Além destes, Gontijo aponta outros mantimentos que devem se destacar e marcar forte presença na mesa dos brasileiros que buscam reduzir o consumo de carne no dia a dia.

“Há várias classes de alimentos que podem tornar-se excelentes opções para veganos e vegetarianos, como as leguminosas de modo geral, os novos cereais (quinoa), bem como os já mais conhecidos, como o centeio, aveia, cevada e o trigo sarraceno”, afirma.

Glúten Free

Com o diagnóstico cada vez mais presente de pessoas portadoras de alergias alimentares, como ao glúten, a engenheira agrônoma pela Esalq/USP e vencedora do Prêmio Péter Murányi 2012, Teresa Vale Losada aposta em um alimento tipicamente brasileiro como o ideal para esse público: a mandioca.

“A mandioca é uma excelente fonte de energia para substituir cereais como o arroz, milho, trigo, etc. A raiz e a farinha (o mais importante derivado para alimentação humana) são ricos em fibras comparativamente ao arroz branco, alguns sais minerais e vitaminas. Mas a mandioca é principalmente uma opção energética, barata e de boa qualidade, que se adapta às condições agrícolas brasileiras”, explica.

A especialista afirma ainda que há muito espaço para que a mandioca chegue à mesa de mais pessoas. “Pode aumentar-se o consumo através de incentivo nas escolas e instituições públicas, e estabelecer políticas públicas que recuperem os hábitos saudáveis, com alimentos minimamente processados”.

Orgânicos

Já o engenheiro agrônomo, pesquisador de tecnologia pós-colheita de frutas e hortaliças da Embrapa e finalista do Prêmio Péter Murányi 2016, Marcos David Ferreira enxerga, além destas tendências, um maior interesse pela origem dos alimentos ditando as escolhas das pessoas na hora das refeições.

“A preocupação com a qualidade dos mantimentos está em primeiro lugar nessa tendência para alimentação. As pessoas estão mais preocupadas em saber de onde as frutas e verduras vem. Querem saber onde foram produzidos, se possuem, por exemplo, resíduos de agrotóxicos”, explica.

Essas novas preocupações, no entendimento do especialista, vêm mostrando também um forte potencial de crescimento para o mercado de alimentos orgânicos. Contudo, Ferreira indica o custo mais alto desses produtos como um entrave para seu crescimento mais expressivo.

“A situação econômica vai influenciar o que as pessoas conseguem consumir. Como são mais caros, os orgânicos não devem crescer tanto, mas a tendência é de as pessoas busquem cada vez mais esse tipo de produto”, conclui.

Nutrição personalizada e inteligência artificial

Na visão do professor Franco Maria Lajolo, do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da USP e vencedor do Prêmio Péter Murányi 2016, a nutrição personalizada deve ser o caminho encontrado, em um futuro não tão distante, para que a humanidade possa lidar com desafios típicos de nosso tempo: as deficiências nutricionais, ocasionadas por um alimentação deficiente e a longevidade em ascendência.

“A população está envelhecendo, mas sem cuidar do que está ingerindo. As pessoas comem muito e mal. Estamos lidando com variados problemas de obesidade e deficiências nutricionais. Para enfrentar essa situação, um caminho que vem se desenhando é a nutrição personalizada. Já existe um bom número de pesquisas mostrando a relação entre genes e a necessidade de nutrientes. Essa tendência está se fortalecendo e estará consolidada em cinco ou dez anos”, explica.

O acadêmico destaca ainda o papel da inteligência artificial na construção desse cenário. O uso de tais tecnologias já permite, por exemplo, a composição da tabela de nutrientes e futuramente, fará de parte de nosso dia a dia e serão aplicadas nos smartphones e outros dispositivos. “A inteligência artificial empodera o indivíduo a construir sua própria dieta, de acordo com seus hábitos e sua genética”.

No entanto, Lajolo aponta um desafio que precisa ser vencido no curto prazo: o combate às fake news e seus efeitos sobre a nutrição dos indivíduos. “Reduzir a ingestão de gorduras saturadas, da ingestão de açúcar e de sal são as maiores tendências que existem na indústria dos alimentos. Mas precisamos, também, educar o consumidor. As notícias falsas passam informações que não estão associadas à ciência. É preciso ensinar o consumidor a buscar conhecimento”, conclui.

Combate ao desperdício

Todos os especialistas consultados são unânimes em apontar uma questão que deve centralizar as discussões, tanto de acadêmicos quanto da população: o combate ao desperdício de alimentos.

“Precisamos reduzir o desperdício, dentro e fora de casa. Atualmente, 30% de tudo o que comemos é desperdiçado. Precisamos encontrar soluções para aproveitar tudo isso”, destaca o professor Franco Lajolo.

A preocupação é compartilhada pelo Dr. Marcos David Ferreira, da Embrapa, que faz um alerta: “É uma questão de falta de conscientização. As pessoas ainda não veem o desperdício como um problema. Dados da FAO indicam que 40% das frutas e hortaliças são jogadas fora. Esse é um percentual muito alto. Quando você joga isso fora, perde-se, também, água, adubo e mão de obra”.

Para contornar esse problema, os dois especialistas destacam a necessidade de ampliar o conhecimento das pessoas sobre os impactos dessa ação, inclusive, é uma preocupação, que segundo Ferreira, já está em invadindo a casa dos brasileiros. “Em um futuro próximo, isso deverá acontecer. Mesmo a trancos e barrancos, a população e os setores da economia vão enxergar a importância dessa conscientização e, consequentemente, da redução do desperdício”, encerra.